Supremo excede competência e cria conflito com STJ, diz ministro

31/08/2009 10:40

    O STF (Supremo Tribunal Federal) julga cada vez mais matérias infraconstitucionais e acaba criando um conflito com o STJ (Superior Tribunal de Justiça). O diagnóstico é do decano do tribunal, ministro Nilson Naves.

    "Hoje existe uma espécie de conflito entre o Superior e o Supremo. Sobre o mesmo tema, a respeito de lei federal, tem-se posições diversas em cada tribunal. Então pergunta-se: qual das duas vale? Se o Supremo não é o tribunal que guarda a lei federal", questiona o ministro, que atua no STJ desde sua criação, há 20 anos.

    A Constituição Federal prevê que o Superior Tribunal tem competência para julgar questões decorrentes de eventual ofensa à lei federal. Já o Supremo deve resolver aquelas em que exista a suspeita de desrespeito à Constituição.

    Para o ministro, a única forma de solucionar tal conflito seria a transformação do Supremo em uma corte exclusivamente constitucional, nesse aspecto, assemelhando-se ao chamado modelo europeu -em que um tribunal constitucional tem o monopólio de analisar ofensas aos princípios da Carta Maior.

    No entanto, Naves constata que o STF está se afastando cada vez mais de tal proposta. "Eu sei que há um grande movimento no mundo jurídico para retomar essa idéia e fazer essa transformação", sinaliza o ministro.

    Nilson Naves anuncia uma peculiar situação que, na prática, já pode ser sentida não apenas no meio jurídico: o fato de que há, no Brasil, quatro graus de jurisdição, uma distorção ao sistema previsto na Constituição. Na teoria, a Justiça brasileira conta com três instâncias, sendo a terceira compartilhada pelo STJ e o STF, cada um com uma competência distinta. Na prática, porém, existem quatro instâncias, com o Supremo apreciando decisões do STJ.

    O ministro lembra que isso ocorre principalmente com habeas corpus, mesmo que envolvam matéria infraconstitucional. "O melhor para o Judiciário é encurtar os passos do processo, que deve ter início, meio e fim o mais rápido possível. Se você aumenta um grau, aumenta os passos do processo", analisa Naves.

    Ele também lembra que tal situação acaba dando margem para o aumento do número de recursos.

    As decisões de primeira e segunda instância, que podem ser revisadas diversas vezes e até serem dadas como "letra morta" devem, de acordo com o ministro, ser valorizadas. "Temos que entender que há inúmeras decisões de enorme valor tomadas em primeiro grau, tanto que, posteriormente, são simplesmente confirmadas segundo grau", afirma.

    "O melhor é prestigiar as decisões de primeiro e segundo grau, deixando a um tribunal como o Superior Tribunal, na matéria infraconstitucional, para se pronunciar a respeito de grandes questões, que tenham repercussão jurídica, e deixando o Supremo com a matéria eminentemente constitucional", diz.

    Mas o ministro ressalta outra realidade: hoje os processos sobem em enorme quantidade ao Superior Tribunal, sem tal distinção. "O melhor seria que tivéssemos uma jurisdição obrigatória e uma discricionária, para dizermos o que vamos ou não julgar, estabelecendo uma relevância jurídica da matéria."

 

Autor: Última Instância/Andréia Henriques